domingo, janeiro 01, 2017

IMAGINÁRiO #643

José de Matos-Cruz | 16 Janeiro 2018 | Edição Kafre | Ano XV – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

REFERÊNCIAS
Nascido em Nova Iorque, no ano de 1942, e com uma carreira iniciada em 1963, Martin Scorsese sobressai numa geração de realizadores cujo talento, modelado pela formação universitária e por um entranhado apelo dos clássicos, subverteria - sob o signo de Hollywood - as motivações tradicionais, quanto à realidade e ao imaginário. Trata-se de um autor cuja autenticidade motiva, além da nostalgia ou do fascínio, singulares expectativas para a reformulação de uma arte, em constante vertigem entre a indústria e o espectáculo… Eis o estímulo radical dum olhar de cineasta - sensível, inteligente, contra as tendências convencionais de mistificação - que, encarando os filmes pela fruição, contrapõe sobretudo, ao artifício crítico, o signo da transfiguração - por vezes violenta, aleatória mas vibrátil - na qual se gera o culto. Aliando a memória e a lenda, Scorsese - descendente de uma família católica italiana - culmina, assim, uma visão sempre original pelo animatógrafo, como referência primordial, apelando ainda aos «filmes de Hollywood que eu amei na adolescência, com uma Nova Iorque mais forte do que aquela por onde andava». IMAG.27-41-44-61-67-81-85-109-134-217-244-246-400-414-490-639

VISTORiA

Adeus

Adeus! e para sempre embora,
Que seja para nunca mais:
Sei teu rancor – mas contra ti
Não me rebelarei jamais.

Visses nu meu peito, onde a fronte
Tu descansavas mansamente
E te tomava um calmo sono
Que perderás completamente:

Que cada fundo pensamento
No coração pudesses ver!
Que estava mal deixá-lo assim
Por fim virias a saber.

Louve-te o mundo por teu acto,
Sorria ele ante a acção feia:
Esse louvor deve ofender-te,
Pois funda-se na dor alheia.

Desfigurassem-me defeitos:
Mão não havia menos dura
Que a de quem antes me abraçava
Que me ferisse assim sem cura?

Não te iludas contudo: o amor
Pode afundar-se devagar;
Porém não pode os corações
Um golpe súbito apartar.
- Lord Byron
(excerto)

Somos do país do sim
o da tristeza em azul
Tudo o que existe é assim
neste sul
Mostramos o sol e o mar
e vendemo-lo a quem tem,
para podermos aguentar
o que vem
Ah país de fato preto
meu país engravatado
do grande amor em soneto
da grande desgraça em fado
- Maria Judite de Carvalho
- A Flor Que Havia Na Água Parada (1998)

CALENDÁRiO

15SET-30OUT2016 - Em Lisboa, Fundação Portuguesa das Comunicações | Museu das Comunicações expõe 100 Obras Em 100 Anos - Mulheres Europeias Na Arquitectura e No Design - 1918-2018; iniciativa do projecto MoMoWo, sendo comissária Maria Helena Souto.

13OUT-31DEZ2016 - Museu de Évora apresenta Pelas Ruas de Macau - exposição de fotografia de Rui Palha.

 15OUT2016 - Na Amadora, Clube Português de Banda Desenhada/CPBD expõe Fernando Bento [1910-1996] - Homenagem ao Grande Desenhador. IMAG.257-299-307-328-367-533-550-578

INVENTÁRiO

Francisco Lázaro - A Emborcação No Treino

Na Revue Olympique nº 80 de agosto de 1912 pode ler-se que, pela primeira vez, desde que os Jogos Olímpicos foram restaurados, o Movimento Olímpico foi atingido pelo luto quando um corredor português sofreu um golpe de insolação que lhe foi fatal. Francisco Lázaro morreu no dia seguinte num hospital de Estocolmo.
Ao cabo de dezasseis anos, desde que os Jogos Olímpicos da era moderna tinham, pela primeira vez, acontecido em Atenas no ano de 1896, morreu um atleta em plena competição. Diz o articulista que apesar da prova ter sido realizada num período quente do dia, o que é facto é que o colapso do atleta não pode ser atribuído ao ligeiro calor sueco (légère chaleur suédoise) uma vez que o calor em Portugal, a que o atleta estava habituado, era muito mais intenso. E o articulista avança para a suposição de que seria muito mais provável que o colapso de Francisco Lázaro (1888-1912) tivesse sido provocado por uma qualquer causa intestinal.

Francisco Lázaro era carpinteiro de uma fábrica de carroçarias de automóveis na Travessa dos Fiéis de Deus no Bairro Alto em Lisboa, foi o porta-estandarte da equipa portuguesa que participou nos Jogos da V Olimpíada da era moderna.
A busca da superação não encontra limites na condição humana. Pierre de Coubertin dizia, e bem, que «não existe desporto sem excessos». E foram os excessos próprios daqueles que buscam a areté – quer dizer, a excelência dos gregos antigos que, muito provavelmente, conduziram o atleta, tal como qualquer herói da Grécia antiga, à morte prematura.
Um médico foi-lhe prestar assistência. Aplicou-lhe gelo em plena estrada. Levaram-no para o hospital onde lhe diagnosticaram uma meningite.
No dia 14 de Julho de 1912, aos 29 km dos 42,185 da Maratona, na colina de Öfver-Järva, Francisco Lázaro cambaleou, caiu por várias vezes e várias vezes se levantou para continuar a prova, até cair para não mais se levantar. (Nolasco, Pedro, 1985).
No Estádio Olímpico de Estocolmo a bandeira portuguesa ficou a meia haste.
Francisco Lázaro é, porventura, a maior lenda do desporto português.
Estocolmo (1912), era a primeira participação portuguesa nos Jogos Olímpicos e, simultaneamente, o culminar de um processo iniciado por D. Carlos Rei de Portugal que, segundo conta a tradição, a pedido de Pierre de Coubertin, indicou o Dr. António Lancastre médico da Casa Real como Encarregado de Negócios do Comité Olímpico Internacional (COI) em Portugal. O que é facto é que a nomeação foi aceite por António Lancastre, e por ele formalizada por carta de 9 de Junho de 1906, dirigida a Pierre de Coubertin. Esta é, na realidade, a data da institucionalização do Movimento Olímpico em Portugal e aquela que, em respeito pela histórica, devia ser comemorada pelo Comité Olímpico de Portugal (COP).
A partida para a Maratona foi dada às onze e meia da manhã debaixo de um calor sufocante. Trinta e dois graus à sombra.
Até desfalecer, Lázaro correu sempre no grupo da frente. Reza a história que antes da partida Lázaro afirmou solenemente «Ou ganho ou morro». E assim  cumpriu o seu destino.
Anos mais tarde, Armando Cortezão, colega de Lázaro na fatídica participação olímpica de 1912, explicou o drama (Correia, Romeu, 1988):
«O Lázaro morreu por dois motivos: primeiro, porque se untou com sebo. Fui eu e o Fernando Correia, quando ele não aparecia à partida na maratona, que o procurámos no balneário e o encontrámos a besuntar-se com sebo. Não faço a menor ideia como Lázaro conseguiu arranjá-lo. Eu e o Fernando Correia ainda tentámos que ele tomasse banho, mas não havia tempo. E ele lá foi correr a maratona todo besuntado com sebo, com os poros da pele tapados, o que impedia a transpiração cutânea nessa parte do corpo… E outra coisa: só ele e um japonês é que foram de cabeça descoberta àquele sol…»
Francisco Lázaro, com o seu procedimento, entrou em desequilíbrio hidro-electrolítico irreversível e, em consequência, em colapso.
A este respeito Armando Cortezão, um dos elementos da equipa portuguesa, contou a Romeu Correia:
«Quando me lembro da nossa ida a Estocolmo, há uma coisa que me irrita sempre. Ainda há pessoas que me falam nisso hoje: o caso do Lázaro! Que o Lázaro fora envenenado… que lhe fizeram essa patifaria para ele perder a corrida… Urn disparate! O Lázaro morreu por dois motivos: primeiro, porque se untou com sebo. Fui eu e o Fernando Correia, quando ele não aparecia à partida da Maratona, que o procurámos no balneário, e lá o encontramos a besuntar-se com sebo… Não faço a menor ideia como o Lázaro conseguiu arranjá-lo (ele que mal falava português), mas conseguiu sebo e estava a untar-se… Eu e o Fernando Correia ficamos apavorados, ainda tentámos que ele tomasse um banho, mas já não havia tempo. E ele lá foi correr a Maratona todo besuntado de sebo, com os poros da pele tapados, o que impedia a transpiração cutânea nessa parte do corpo. E outra coisa: Só ele e um japonês é que foram de cabeça descoberta, àquele Sol.»
Acreditamos que assim tenha sido, mas não só…
Contudo, o verdadeiro problema de Lázaro não se deve ter ficado pela essência de terebintina e o ácido acético. Ao tempo, a emborcação ia bem mais longe. De facto, a comunicação social informou que Lázaro abusava da estricnina.
- Gustavo Pires (excertos)

MEMÓRiA

1921-18JAN1998 - Maria Judite de Carvalho: Escritora portuguesa, autora de Os Armários Vazios (1978) - «Eu dantes tinha olhos verdes / só agora reparei. / Verdes, viam tudo verde / por que eram verdes, não sei. / Sorriam àquela flor / que havia na água parada. / Verde flor, na verde água / da vida transfigurada. / Hoje olham e reconhecem / que há muito mais cores para ver. / Cor de flor, que logo esquecem, / cor de charco a apodrecer.» (A Flor Que Havia Na Água Parada). IMAG.376

19JAN1798-1857 - Isidore Auguste Marie François Xavier Comte, aliás Auguste Comte: Filósofo francês, fundador do Positivismo - «O Amor por princípio, e a Ordem por base; o Progresso por fim». IMAG.625

21JAN1888-1912 - Francisco Lázaro: Atleta português, participou na prova da Maratona dos Jogos Olímpicos de Estocolmo (1912), durante a qual desfaleceu, vindo a morrer horas depois, por causas múltiplas. IMAG.7-378-437

22JAN1788-1824 - George Gordon Noel Byron, aliás Lord Byron: Poeta britânico - «Vivi, amei, bebi, tal como tu; morri; / Que renuncie a terra aos ossos meus. / Enche! Não podes injuriar-me; tem o verme / Lábios mais repugnantes do que os teus.» (Versos Inscritos Numa Taça Feita de Um Crânio). IMAG.79-163-463

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