terça-feira, abril 26, 2016

IMAGINÁRiO #607

José de Matos-Cruz | 16 Abril 2017 | Edição Kafre | Ano XIV – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO
 
DEMANDAS
Um mundo longínquo, há muitos e muitos anos. Numa bucólica aldeia do Vale Verde, vivem os Grinos. Se perguntássemos a um destes anões agricultores, qual o seu maior desejo, responderia: «Controlar a chuva», indispensável aos magníficos campos de cultivo. Um dia, o Conselho de Sábios envia uma expedição aos distantes Montes de Vidro, para descobrir o segredo dos Sopradores de Nuvens, gigantes azuis capazes de influenciar os elementos naturais. Os aventureiros regressam com Orull, um semi-deus, com extraordinários poderes… Privilegiando uma vertente especialmente destinada aos mais jovens, eis Orull, o Senhor das Nuvens / Orull, le Faiseur de Nuages (1998), por Denis-Pierre Filippi (argumentista) e Tiburce Oger (ilustrador). Ao conjugar a heroic-fantasy de vanguarda com os intemporais contos de fadas, esta talentosa dupla artística principiou Orull, le Souffleur de Nuages - uma saga mágica, luxuriante, com distintos níveis de leitura e sugestão, tendo em vista «regressar à origem obscura e ancestral dos cancioneiros infantis».
 
VISTORiA
 
A Serenata
 
¨Vestida de gemidos de bordão,
lancinâncias de violino,
na noite parada
vem descendo a seresta.

Sumiu-se a cidade barulhenta
inimiga das crianças e dos poetas.

Uma voz canta sentimentalmente um samba.

                   Aquele aperto de mão
                   não foi adeus!

Os cavaquinhos desmaiam de puro sentimento,
a cidade morreu lá longe,
e a lua vem surgindo cor de prata.

                   Nessa história de amor todos são iguais,
                   até o rei volta sua palavra atrás…

O meio tom brasileiro deixa interrogativamente a sua
                nostalgia.

                   É hora que os poetas escolheram
                   para a procura dos seus mundos perdidos…
                                                  
Amanhã a cidade virá novamente
inimiga dos poetas.
Mas agora ela dorme,
ela não sabe que os poetas falam com Nossenhor,
com a lua e as estrelas,
nesta hora tão lírica…

Menina romântica, irmã
das crianças e dos poetas…
A tua janela, florida de esperanças,
é um mistério que a cidade não entende.

Passa a serenata.
Mas no coração dos que temem a primeira luz do dia que vai
chegar
ficam os gemidos do violão e do cavaquinho,
vozes crioulas neste noturno brasileiro
de Cabo Verde.
Baltazar Lopes / Osvaldo Alcântara
 
CALENDÁRiO
 
18FEV-24MAR2016 - Bedeteca da Amadora apresenta, na Biblioteca Municipal Fernando Piteira Santos, ‘Os Doze de Inglaterra’ de Eduardo Teixeira Coelho - exposição de materiais originais de impressão da obra, impressões do livro e arte original do artista. IMAG.28-31-41-43-85-117-129-132-209-328-372-568-578

µ27FEV-11JUN2016 - Em Guimarães, Palácio Vila Flor apresenta Still There - exposição de fotografia (Líbano, 2011) de Carlos Lobo.

¢03MAR-15MAI2016 - Centro de Exposições de Odivelas apresenta, na Galeria D. Dinis, a exposição retrospectiva de pintura João Feijó - 30 Anos Pela Arte.

VISTORiA
 
¨ Julgo razoável, leitor, antes de prosseguirmos juntos, explicar-lhe que, sempre que tiver ensejo ou oportunidade, pretendo fazer digressões no decurso de toda esta história, da qual sou melhor juiz do que qualquer lastimoso crítico que exista; e cumpre-me pedir aqui a todos esses críticos que tratem da sua vida, e não se metam em negócios ou obras que, de maneira nenhuma, lhes dizem respeito; pois, enquanto não demonstrarem a autoridade por cuja virtude se constituíram juízes, não me sujeitarei à sua jurisdição.
Henry Fielding
- A História de Tom Jones (1749 - excerto)
                     



MEMÓRiA
 
15ABR1707-1783 - Leonhard Paul Euler: Matemático e físico suíço de língua alemã, radicado na Rússia e na Alemanha, desenvolveu a geometria analítica e a trigonometria - «Calculava, sem esforço aparente, como os homens respiram, como as águias planam ao vento» (François Arago - 1786-1853). IMAG.146

¨ 18ABR1927-2008 - Samuel Phillips Huntington, aliás Samuel Huntington: Escritor e analista americano, especialista em ciência política - «O universalismo ocidental é perigoso para o mundo… [Importa] reconhecer que a intervenção ocidental nos assuntos de outras civilizações é, provavelmente, a mais perigosa causa de instabilidade e de potencial conflito global num mundo multicivilizacional.» (Clash of Civilizations - 1993).

¨ 22ABR1707-1754 - Henry Fielding: Novelista e dramaturgo inglês, um dos fundadores do romance moderno; em 1754, radicou-se em Lisboa, à procura de melhor clima. Tendo escrito Journal of a Voyage To Lisbon, faleceu dois meses depois na capital portuguesa, e foi enterrado no Cemitério dos Ingleses. IMAG.140-486

¨ 1783-23ABR1847 - Erik Gustaf Geijer: Escritor e compositor sueco - «Cada um de nós tem qualidades para fazer alguma coisa melhor do que as outras pessoas». IMAG.402

¨ 23ABR1907-1989 - Baltazar Lopes da Silva, aliás Osvaldo Alcântara: Poeta, ficcionista e linguista cabo-verdiano, cultor do crioulo, co-fundador do movimento Claridade - «Venham todas as vozes, todos os ruídos e todos os gritos, / venham os silêncios compadecidos e também os silêncios satisfeitos;  / venham todas as coisas que não consigo ver na superfície da sociedade dos homens; / venham todas as areias, lodos, fragmentos de rocha / que a sonda recolhe nos oceanos navegáveis…» (Ressaca - excerto).
               
PARLATÓRiO
 
¨ Um autor deve considerar-se, não um cavalheiro que oferece um banquete particular ou de caridade, e sim alguém que dirige uma casa de pasto, pública, na qual são bem-vindas todas as pessoas, em troca do seu dinheiro.
Henry Fielding
           
SUMÁRiO
 
Matemático suíço, nascido em 1707 e falecido em 1783, foi um professor brilhante, cuja autoridade foi incontestada, expandindo todas as áreas conhecidas da Matemática. O seu nome está ligado a uma grande quantidade de entidades matemáticas como o número e – número de Euler –, base dos logaritmos naturais, e o número i, número imaginário. Aluno de Johann Bernoulli, foi grande amigo do sobrinho deste, Daniel Bernoulli, que o chamou para São Petersburgo, Rússia, onde foi professor no Colégio Naval e na Academia de Ciências (1730). Aqui, no seguimento de observações astronómicas, ao olhar para o Sol, perdeu a visão do olho direito. De 1741 a 1766, deslocou-se para Berlim, onde foi director da Academia de Ciências. Voltaria à Rússia a convite de Catarina, a Grande, tornando-se director da Academia de Ciências de São Petersburgo. Ficaria completamente cego, devido a cataratas, mantendo todas as suas responsabilidades e trabalhos durante mais de quinze anos até à sua morte.
          
BREVIÁRiO
 
Gradiva edita Os Doze de Inglaterra (1950-1951) de Eduardo Teixeira Coelho (1919-2005).

¯Harmonia Mundi edita em CD, Michel-Richard de Lalande [1657-1726]: Leçons de Ténèbres por Sophie Karthäuser, com Ensemble Correspondances, sob a direcção de Sébastien Daucé.
            
COMENTÁRiO

Pela primeira vez, os admiradores do grande mestre Eduardo Teixeira Coelho vão poder apreciar na íntegra uma das obras mais belas que desenhou, Os Doze de Inglaterra. Trata-se, seguramente, de uma obra-prima da literatura de quadradinhos mundial.
Publicada agora, finalmente, em álbum, sem as amputações que na sua edição original [O Mosquito, 1950-1951] sacrificaram, frequentemente, a integralidade do desenho ao espaço ocupado pelo texto de Raul Correia – também ele belo, mas, nalguns passos, porventura, redundante –, numa edição que só foi possível pela arte, o conhecimento e o empenho de outro grande criador da banda desenhada portuguesa, José Ruy.
Guilherme Valente
(Editor da Gradiva)


sábado, abril 23, 2016

IMAGINÁRiO EXTRA: Daniel Maia - Exposição a solo

De dia 30 Abril a 20 de Maio, o Ateneu Popular do Montijo vai expor Traços & Tons, uma mostra composta por uma selecção de trabalhos recentes, figurando personagens de comics, como Batman, Tartarugas Ninja e Mulher-Maravilha, ou de ficção como O Infante Portugal (criado por José de Matos-Cruz), e complementada por diários gráficos e cadernos de desenho.
Comissariada por Marta Ferreira, a exposição visa mostrar obras recentes, em banda desenhada e ilustração, demonstrar o meu processo de trabalho – que será de interesse ao público escolar, para dar a conhecer as fases criativas que levam um trabalho desde o guião ou esboço inicial à peça finalizada e respectiva edição –, e partilhar comparações entre estes e desenhos de fase amadora, pré-adolescência.

Volvidos dez anos desde que exponho a solo, estarei presente na inauguração, no dia 30 Abril, às 15h30. Estão convidados a comparecer.
Agradeço à direcção do Ateneu Popular de Montijo, a Marta Ferreira e João Miguel Ferreira, pelo convite e organização da mostra; à Câmara Municipal do Montijo e Junta de Freguesia da União de Freguesias de Montijo e Afonsoeiro, pelo apoio prestado; e a José de Matos-Cruz e direcção da Bedeteca da Biblioteca Municipal de S. Domingos de Rana, pela cedência do seu ex-libris para imagem gráfica do cartaz do evento.
?Daniel Maia
LIMAG.196-387-416-430-435-528-538-563-596

quarta-feira, abril 20, 2016

IMAGINÁRiO EXTRA: Susana Resende - Navegador

Talento, sensibilidade e uma rigorosa, mas versátil e sugestiva expressão gráfica, estimulam a criatividade de Susana Resende, que tem estendido as virtualidades como artista plástica e ilustradora profissional ao universo da banda desenhada.
Assim, e a partir da revelação em 2013, com Sayonara (no álbum antológico Zona Nippon 2 – distinguida com o 2º lugar na categoria Melhor Obra Curta dos XII Troféus Central Comics), destacam-se a prancha autoconclusiva Cadáver Esquisito! #51 (na banda desenhada colectiva em método cadavre exquis, coordenada por Daniel Maia, 2015), 24 (sobre história breve de André Oliveira, na revista Cais #212, 2015) e, já sob o signo da maturidade, também como argumentista, Navegador (na revista Gerador #6, 2015).
Pessoalmente, assinalo a estilizada transfiguração com que Susana Resende participou em O Infante Portugal e as Sombras Mutantes (Apenas Livros, 2012), tendo – entretanto – aceite o desafio para conceber as visões originais de Aurora Boreal, a que se seguiu uma deslumbrante e prodigiosa inspiração para esta minha saga, actualmente em expansão narrativa. E deixo manifesto o meu apreço pelos atributos inquietadores e fantásticos que se enunciam em Navegador, aliando uma perturbante conflitualidade ficcional às valências da textura cromática.
IMAG.403-416-430-528-563



terça-feira, abril 19, 2016

IMAGINÁRiO #606

José de Matos-Cruz | 08 Abril 2017 | Edição Kafre | Ano XIV – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO
 
(IN)SUCESSOS
Sustentado por uma indústria precária e esporádica, o cinema português encontra na essência artística a sua motivação primordial, com os inerentes desaires quando se pretende explorá-lo como um mero negócio. Os exemplos são quase tantos, quantas as tentativas sobre os filmes em causa, ao longo de um século - gerando a decepção, o afastamento, o rancor ou, mesmo, a ruína daqueles que o manipularam numa mera expectativa comercial. Porém, há casos de um insólito sucesso, e outros marcados por um bizarro sentido de oportunidade. Assim, Os Crimes de Diogo Alves (1911 - João Tavares), a nossa primeira ficção autónoma, continuava a ser explorada nos anos ’30, já em pleno sonoro. E A Severa (1931 - Leitão de Barros), nossa primeira longa metragem falante, era reposta em 1955, a propósito da peça de Júlio Dantas, então em cena no Teatro Monumental. Mais recentemente, quando estreou Amor de Perdição (1978) de Manoel de Oliveira, também reaparecia o clássico (1943) de António Lopes Ribeiro, sobre a obra de Camilo Castelo Branco… Em geral, faltando ao cinema português uma estratégia notória de rendibilização nas salas, o alento maior de sobrevivência ou ressurreição seria atribuído por alternativas excepcionais - como a passagem na televisão ou a edição em vídeo.
  
CALENDÁRiO
 
18FEV-25ABR2016 - No Porto, Galeria Municipal / Jardins do Palácio de Cristal apresenta Habitar Portugal 12-14 - um olhar sobre a produção arquitectónica portuguesa do triénio (obras concluídas entre 01JAN2012 e 31DEZ2014), em exposição organizada pela Ordem dos Arquitectos, com a Câmara Municipal do Porto.

¨28ABR2026-19FEV2016 - Nelle Harper Lee, aliás Harper Lee: Ficcionista americana, autora de Mataram a Cotovia/Não Matem a Cotovia (1960) - «A única coisa que não devemos curvar ao julgamento da maioria é a nossa própria consciência».

 ¨1932-19FEV2016 - Umberto Eco: Escritor italiano, filósofo e semiólogo, ensaísta e ficcionista, autor de O Nome da Rosa (1980) - «Nada é mais nocivo para a criatividade do que o furor da inspiração». IMAG.22-40-58-175-283-417-603

¢23JAN-01MAI2016 - Em Évora, Fórum Eugénio de Almeida expõe Realidade Suspensa de Michael Biberstein (1948-2013), sendo curador Reto Pulfer; e Estados de Rememoração de Reto Pulfer, sendo curadora Filipa Oliveira.
      
VISTORiA
 
O Bailado Velado

¨Na encruzilhada impossível da imobilidade
uma turba de objectos inertes
não consegue parar de se mover fremir dançar
E os carteiros do vento
como os do mar
espalham a correspondência aqui e lá
Cada coisa sem dúvida se destina a alguém
       ou a alguma coisa talvez
A pluma da ave
como a concha da ostra
a cruz da legião de honra
como a estrela do mar
ou a pinça do caranguejo e a âncora da fragata
a rã verde de lata
e a boneca de som
e a coleira do cão
E nesta paisagem onde nada parecia mexer-se
excepto a vela do náufrago na lanterna em ferrugem
é o bailado velado
o bailado dos objectos inanimados.
Jacques Prévert
(Tradução de Adriano Scandolara)

MEMÓRiA
 
 10ABR1847-1911 - Joseph Pulitzer: Emigrante húngaro nos EUA, repórter - «um defensor ao lado das pessoas, um porta-voz da democracia» -, empresário e proprietário de The World (1883), definiu as regras de um jornalismo rigoroso e confiou parte da fortuna à Universidade de Columbia, Nova Iorque, a partir da qual foi instituído o Prémio Pulitzer (1917), com o objectivo de «encorajar e distinguir a excelência». IMAG.344

¯ 1562-11ABR1607 - Bento de Goes: Missionário e explorador português - por ordem de Nicolau Pimenta, Visitador da Companhia de Jesus em Goa, percorreu a Rota da Seda, em busca do mítico Cataio, e morreu exausto junto à Grande Muralha da China, próximo já de Pequim. IMAG.126

¨ 1900-11ABR1977 - Jacques Prévert: Poeta francês, autor de Paroles (1946) - «Teus jovens seios brilhavam ao luar / Mas arremeti o / Gelo frio / Da pedra do ciúme / Contra o rio / Que reflectia o / Dançar de tua nudez na Riviera / Pelo esplendor do estio.» (Riviera). IMAG.185-262

¨ 1903-11ABR1987 - Erskine Preston Caldwell, aliás Erskine Caldwell: Escritor americano, autor de Estrada do Tabaco (1932) - «Um bom Governo é como uma boa digestão… Enquanto funciona, nem nos apercebemos». IMAG.593

¨ 1919-11ABR1987 - Primo Levi: Escritor italiano, prisioneiro em Auschwitz, autor de Se Isto É Um Homem (1947) - «O objectivo da vida é criar a melhor defesa possível contra a morte». IMAG.126-236-244-412-416-575

¨ 12ABR1947-2013 - Thomas Leo Clancy Jr, aliás Tom Clancy: Ficcionista americano, criador da personagem de Jack Ryan - «Hoje em dia, as pessoas vivem mais tempo do que no passado. E vivem vidas mais felizes, possuem mais conhecimento, mais informação. Tudo isto é o resultado da tecnologia da comunicação… Pessoalmente, considero-me alguém com sorte. Mas não acredito em nada. Tudo que faço, é analisar as possibilidades». IMAG.488
                     
TRAJECTÓRiA
 
BENTO DE GOES
¯ Nasceu Luiz Gonçalves em Vila Franca do Campo, Ilha de São Miguel, em Julho de 1562. Foi para a Índia como soldado, entrando na Companhia de Jesus em 1584. Abandonando o noviciado, ao frustrar-se o sacerdócio, dirigiu-se a Ormuz, mas regressou à Companhia de Inácio de Loiola em 1588, para tornar-se Irmão como Bento de Goes.
A 3 de Dezembro de 1594, pediu missão diplomática ao reino Mogol, onde logrou as simpatias de Ackbar, levando-o a manter-se em paz com o Vice-Rei, em Goa, através duma embaixada de que foi incumbido, em 1600-1601. Os superiores jesuítas da Índia pretendiam descobrir o caminho terrestre até à China, contornando e transpondo pelo poente as cadeias dos Himalaias, para desvendar o mistério do Grão-Cataio e a sua identificação com o Império Celeste, tal como presumia Mateo Ricci. Nicolau Pimenta confiou-lhe tal empresa, pois sabia o persa, o turco e os costumes muçulmanos. Disfarçado de mercador arménio, com o nome de Banda Abdullah ou Abdulllah Isahi, e acompanhado por dois negociantes gregos, Leone Grimam e Demétrio, dirigiu-se pelo Dekong, com o arménio Isaac como criado, a Agra em 29 de Outubro de 1602, e a Lahore a 6 de Janeiro de 1603. Com cartas de recomendação de Ackbar, chegou a Cabul, onde Grimam permaneceu. Prosseguiu com a irmã do Khan de Casgar, que, regressada de peregrinação a Meca, encontrara em Cabul, emprestando-lhe o produto da venda de umas pedras semipreciosas. Galgou o planalto de Pamir e, em Novembro de 1603, chegava a Iarcand, onde ficou até 14 de Novembro de 1604, visitando Chotan, para ser retribuído dos favores à rainha-mãe, da qual se fizera credor em Cabul.
Prosseguindo para leste, por Zilan e Cucha, chegou a Chalis, onde recebeu as primeiras notícias dos missionários de Pequim e, em 22 de Dezembro de 1605, atingiu Soucheu, extremo da Grande Muralha. Ali, pôde identificar o Cataio com a China e Kambalik com Pequim. Dirigindo recados a Mateo Ricci, este enviou-lhe um jesuíta chinês, Ciommimli, aliás João Fernandes, que o encontrou mísero e doente. Faleceu em Soucheu, China, a 11 de Abril de 1607. Com notas avulsas da viagem, relatada num diário, contendo apontamentos que os devedores muçulmanos tentaram destruir, para evitar o pagamento, mas recolhidos por Isaac e Ciommimli, Ricci logrou reconstituir o itinerário de Bento de Goes, em 1608-1610.
            
COMENTÁRiO
 
 A nossa República e a sua Imprensa erguer-se-ão e cairão juntas… O poder para moldar o futuro da República estará nas mãos dos jornalistas das próximas gerações.
Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela própria.
Joseph Pulitzer
- The North American Review (1904)
            
PARLATÓRiO
 
¨ Com o passar dos anos, as minhas recordações não empalidecem nem se dissipam, pelo contrário, enriquecem-se com detalhes que eu acreditava esquecidos e que, às vezes, adquirem sentido à luz das recordações de outras pessoas, de cartas que recebo ou de livros que leio.
Primo Levi
           
BREVIÁRiO
 

¨ Alêtheia Editores lança Os Lugar-Tenentes de Salazar (1889-1970) - Biografias de Manuel de Lucena (1938-2015). IMAG.554

segunda-feira, abril 18, 2016

IMAGINÁRiO #605

José de Matos-Cruz | 01 Abril 2017 | Edição Kafre | Ano XIV – Semanal – Fundado em 2004


PRONTUÁRiO
 
CREPÚSCULOS
Num panorama de banda desenhada por autores portugueses, David Soares - lisboeta nascido em 1976, artista gráfico e editor de fanzines - sobressairia como um autor aliciante, em evolução pelo Círculo de Abuso. Após Cidade-Túmulo e Mr. Burroughs em álbuns de 2000, o novo milénio foi estigmatizado com Sammahel (2001), pelas sombras do nazismo durante o século findo. Escritor e ilustrador, Soares apelou à inspiração de Thomas Mann, em Doutor Fausto, reivindicando um fascínio pela «literatura alemã; e por toda a literatura da Europa do leste, já que o menciono». Em causa está uma descida ao inferno que habita no íntimo de Adrian Leverkhün, estudante de teologia e compositor. Obcecado pelo medo de executar a sua música, com o pressentimento de que morrerá, Adrian parece nem se aperceber do regime de horror que germina na Alemanha, e avassalará na crepuscular bestialidade do Terceiro Reich. Uma obra complexa, madura e perturbante, Sammahel apela à consciência cultural/histórica do leitor, consumando as virtualidades de um criador que se aprofunda, sob o desígnio da sua radicalidade. IMAG.6-358-410


CALENDÁRiO
 
¢06FEV-08MAI2016 - No Porto, Museu de Arte Contemporânea de Serralves apresenta The Sonnabend Collection: Meio Século de Arte Europeia e Americana (Parte 1), sendo comissário António Homem. IMAG.554

¢20FEV2016 - Na Amadora, Casa Roque Gameiro apresenta A Casa, Vida e Obra da Família [Alfredo] Roque Gameiro (1864-1935) - exposição permanente, e a Coletiva da Associação de Aguarela de Portugal. IMAG.197-558-585-602

¯ABR1937-14FEV2016 - Vera Varela Cid: Bailarina portuguesa, professora de dança, co-fundadora da Companhia Nacional de Bailado/CNB (1977) - «Deixa um legado de dedicação, profissionalismo e criatividade artística de valor inestimável, na história do bailado e das artes performativas em Portugal» (Ministério da Cultura).
      
PARLATÓRiO
 
¯Não custa muito escrever música, mas é extraordinariamente difícil deixar as notas supérfluas em cima da secretária… Por vezes, eu pondero em variantes formais, e o resultado final acaba por me parecer mais específico, mais puro.
Johannes Brahms

¨ Continuo a viajar pela arte. Neste fim-de-semana, não sei o que se passou com o mundo. Não quero saber. Por uma noite, permitam-me ser como a avestruz. Só por esta noite, porque amanhã já é segunda feira…
Leonora Carrington
              
VISTORi

Desaparecido
¨Sempre que leio nos jornais:
«De casa de seus pais desapar’ceu…»
Embora sejam outros os sinais,
Suponho sempre que sou eu.

Eu, verdadeiramente jovem,
Que por caminhos meus e naturais,
Do meu veleiro, que ora os outros movem,
Pudesse ser o próprio arrais.

Eu, que tentasse errado norte;
Vencido, embora, por contrário vento,
Mas desprezasse, consciente e forte,
O porto do arrependimento.

Eu, que pudesse, enfim, ser eu!
– Livre o instinto, em vez de coagido.
«De casa de seus pais desapar’ceu…»
Eu, o feliz desaparecido!
Carlos Queiroz
- Desaparecido e Outros Poemas (1950)


MEMÓRiA

¯1833-03ABR1897 - Johannes Brahms: Compositor alemão - «Herdeiro de Beethoven, oferece em sua obra a síntese perfeita do romantismo e do classicismo. Não desprezou o canto popular húngaro, que incorporou a uma poesia tipicamente nórdica e suntuosa» (Renata Cortez Sica). IMAG.82-171-193-199-256-286-303-324-393-417-482-531-554-597

¨ 05ABR1907-1949 - José Carlos de Queiroz Nunes Ribeiro, aliás Carlos Queiroz: Poeta e ensaísta português - «Por que vieste? – Não chamei por ti! / Era tão natural o que eu pensava, / (Nem triste, nem alegre, de maneira / Que pudesse sentir a tua falta…) / E tu vieste, / Como se fosses necessária!» (Apelo à Poesia). IMAG.167-307-491

¨ 1926-05ABR1997 - Irwin Allen Ginsberg, aliás Allen Ginsberg: Poeta americano, ligado à beat generation - «Os corpos quentes / brilham juntos / na escuridão, / a mão move-se / para o centro / da carne, / a pele treme / na felicidade / e a alma sobe / feliz até ao olhar – // sim, sim, / é isso que / eu queria, / eu sempre quis, / eu sempre quis / voltar / ao corpo / em que nasci.» (Canção). IMAG.9-13-64-85-89-247-306-362-426-469-565

¨ 06ABR1917-2011 - Leonora Carrington: Escritora, pintora e escultora de origem inglesa, ligada ao surrealismo e ao México - «Não é uma poetisa, mas um poema que caminha, que sorri, que de repente exibe o seu sorriso e se converte em pássaro, depois em peixe, e desaparece» (Octavio Paz). IMAG.361

1863-07ABR1947 - Henry Ford: Industrial americano - «Se o dinheiro for a nossa esperança de independência, jamais a alcançaremos. A única segurança verdadeira consiste numa reserva de sabedoria, de experiência e de competência… Há um punhado de homens que conseguem enriquecer, simplesmente, porque prestam atenção aos pormenores que a maior parte das pessoas despreza». IMAG.125-428
                                   
TRAJECTÓRiA
 
Joannes Brahms
¯ Compositor e pianista alemão, Brahms nasceu em 1833, em Hamburgo, na Alemanha, e morreu em 1897, em Viena, na Áustria. Compôs sinfonias, concertos, música de câmara, peças para piano, peças corais e mais de 200 canções. Foi o grande mestre da sinfonia e da sonata da segunda metade do século XIX e um dos grandes compositores da época romântica.
Johannes Brahms era talentoso, produtivo e, além do êxito alcançado, tornou-se imensamente popular. Apesar disso, era visto como um conservador, em contraste com o progressismo de outros compositores seus contemporâneos. As suas sinfonias e concertos são bastante formais e não fossem os pequenos toques de classe, nomeadamente em alguns andamentos, não seriam hoje tão considerados. A sua excelência revela-se nesses pequenos detalhes. Talvez por isso, os seus trabalhos de menor dimensão - as peças de câmara e as sonatas - demonstrem tanta imaginação e energia. O simples facto de a sua Primeira Sinfonia ser ironicamente apelidada de Décima de Beethoven, prova o seu apego ao formalismo clássico de um compositor falecido há 50 anos. Adicionalmente, o facto de Johannes Brahms se ter demarcado de Liszt, Wagner e Bruchner e outros compositores da chamada Nova Escola Alemã atesta a sua inadaptação à rápida mudança estética da segunda metade do século XIX.
Os estudos musicais de Brahms foram iniciados muito cedo, no piano e na composição. O seu desejo era ser reconhecido como maestro e compositor. Tornou-se amigo de Robert Schumann, até porque partilhavam o mesmo estilo musical. A partir daí, Brahms tentou a sua sorte em Viena, a capital musical da Europa, e conheceu algum sucesso. Adicionalmente, atuou um pouco por toda a Europa, dando a conhecer a sua obra, perante audiências cada vez maiores. Depois disso, como muitos outros músicos, tornou-se professor. Quando em 1869 compôs Um Requiem Alemão, um trabalho coral e orquestral grandioso, conseguiu críticas bastante positivas e o retorno financeiro de que necessitava. Com a confiança renovada, trabalhou no formato que sempre o tinha amedrontado: a sinfonia. Veio a compor quatro sinfonias, além de numerosos concertos.
Entre as suas composições mais conhecidas encontram-se o Concerto para Piano N.º 1 em Ré Menor (1854-58), o Um Requiem Alemão (1868), as Danças Húngaras (1869), as Variações sobre um Tema de Haydn (1873), a Sinfonia N.º 1 em Dó Menor (1876), a Sinfonia N.º 2 em Ré Maior (1877), o Concerto para Violino em Ré Maior (1878), a Sinfonia N.º 3 em Fá Maior (1883), a Sinfonia N.º 4 em Mi Menor (1884-85), a Sonata para Violino em Ré Menor (1886-88), o Quinteto para Cordas em Fá Maior (1882), o Quinteto para Cordas em Sol Maior (1890), o Quinteto para Clarinete e Cordas (1891) e as Sonatas para Clarinete e Piano (1894).
Uma boa parte da sua obra foi inspirada diretamente na música popular alemã, húngara e zíngara. Toda a sua música apresenta solidez, riqueza harmónica, expressividade melódica e uma força rítmica baseada na utilização de síncopas. Embora não tenha sido um inovador, a sua arte marca uma forte maturidade dentro do movimento romântico alemão, o que faz de Brahms uma das figuras máximas da História da música.
        
SUMÁRiO
 
¨ Nasceu em 1907, em Paris. Poeta, ensaísta, crítico literário e de arte, estudou Direito na Universidade de Coimbra, tornando-se funcionário da Emissora Nacional, onde organizou programas culturais. Assíduo colaborador da Presença e de outras publicações literárias, foi considerado um elo de ligação entre a geração presencista e a de Orpheu. Considerado um discípulo directo de Fernando Pessoa, a sua poesia caracteriza-se pela perfeição formal, pelo equilíbrio e sobriedade e pela sugestão musical. Denuncia alguma herança romântica e certa aproximação ao simbolismo. Morreu em 1949, em Paris.
        
BREVIÁRiO
 
¨ Relógio D’Água edita Convite Para Uma Decapitação de Vladimir Nabokov (1899-1977); tradução de Carlos Leite. IMAG.63-223-253-272-325-338-418-503-504-505-507-600
 
¨ Cavalo de Ferro edita Thérèse Desqueyroux de François Mauriac (1885-1970); tradução de Manuela Barros. IMAG.112-484-534

¨ Fundação Francisco Manuel dos Santos edita Malditos - Histórias de Homens e de Lobos de Ricardo J. Rodrigues.