José
de Matos-Cruz | 24 Setembro 2017 | Edição Kafre | Ano XIV –
Semanal – Fundado em 2004
PRONTUÁRiO
AVENTURAS
Suriá
era bem pequenininha quando nasceu. O pai e a mãe são malabaristas,
e ela é uma miúda cheia de ideias trepidantes. E malabarista…
Eis a apresentação de Suriá
- A Garota do Circo! (2000),
revelando mais uma vertente do prolífico talento de Laerte Coutinho,
em sua peculiar expressão sensível e divertida. Confessando que tem
um pé em Portugal, pois «meu bisavô Miguel veio de Ponte do Lima»,
o popular artista brasileiro dedicou à filha Laila este livro, que
resulta de uma aliança editorial entre a Jacarandá e a Devir. Em
rodapé às aventuras de Suriá com os amigos (Marion, Luca, Sílvio,
Robledo) e bichos (o leão Daniel, a elefanta Úrsula, o urso Kurtz,
o camelo Gaspar, o macaco Fred), Laerte apresenta a história e as
estórias sobre O
Mundo do Circo.
Suriá foi criada para a Folhinha,
suplemento infantil do jornal Folha
de São Paulo,
tendo original publicação em 1997-98. Aí prosseguiu Laerte - com
site
na internet: www.laerte.com.br - a sua actividade regular e
irresistível. Formando com Angeli uma cumplicidade de nomes maiores
dos quadrinhos, em sátira aos costumes e vivências sociopolíticas,
através de uma leitura irreverente e corrosiva, para adultos.
IMAG.560
CALENDÁRiO
¨1928-27JUN2016
- Alvin Toffler: Escritor e futurista americano, autor de Choque
do Futuro (1970)
- «Os analfabetos do próximo século, não serão aqueles que não
sabem ler ou escrever, mas aqueles que se recusam a aprender,
reaprender e voltar a aprender».
¸1929-27JUN2016
- Carlo Pedersoli, aliás Bud Spencer: Nadador e actor italiano,
intérprete de Trinitá
- Cowboy Insolente (1970)
com Mario Girotti / Terence Hill - «Era daqueles actores populares
cujo carisma poucos conseguiam explicar» (Rui Pedro Tendinha).
®1924-02JUL2016
- Camilo Venâncio de Oliveira, aliás Camilo de Oliveira: Actor e
argumentista português - «Foi tanta gente nos palcos e na
televisão, nunca deixando de ser um exigente trabalhador para que o
povo se risse de si próprio e sobretudo desta condição de sermos
portugueses» (Júlio Isidro).
¸1939-02JUL2016
- Michael Cimino: Cineasta americano, produtor e argumentista,
realizador de O
Caçador / The Deer Hunter (1978)
- «A indústria de Hollywood não mudou absolutamente nada. Continua
exactamente igual ao que sempre foi. A única coisa que se alterou
foi o rosto dos jogadores. As pessoas morrem, desaparecem,
reformam-se, mas o sistema permanece de pé» (a Vincent Maraval -
Sofilm#03
- registo de Brieux Férot). IMAG.72-287-331-443
BREVIÁRiO
¨Dom Quixote edita Açores - O Segredo das Ilhas de João de Melo. IMAG.94-157-191-297-298-627
NOTICIÁRiO
O Primeiro Telégrafo
O
Governo americano deseja comprar o aparelho telegráfico, como
curiosidade histórica. Esse aparelho foi construído por Alfred
Vail, e deve custar nove contos de réis.
21JUL1888
- Diário
de Notícias
COMENTÁRiO
O amor não é senão o desejo; e assim, o desejo é o princípio original de que todas as nossas paixões decorrem, como os riachos da sua origem; por isso, sempre que o desejo de um objecto se acende nos nossos corações, pomo-nos a persegui-lo e a procurá-lo, e somos levados a mil desordens.
Miguel
de Cervantes
PARLATÓRiO
É
indubitável que entre a minha obra, a minha maneira de pintar e a
publicidade, há uma relação muito directa. Às vezes, censuram-me
por, com o meu estilo, contribuir para tornar mais aceitável essa
publicidade e incrementar o consumismo. Porém, existe uma enorme
ironia no meu trabalho. Pelo menos, procuro assumir uma postura
crítica face aos temas que represento, de sarcasmo perante a nossa
cultura industrial e de desprendimento visual quanto à sociedade
industrializada. Aquilo que, a princípio, parecia tipicamente
americano, converteu-se, actualmente, num fenómeno internacional.
Daí que a minha pintura já possa ser compreendida em todo o mundo.
Roy
Lichtenstein (1983)
VISTORiA
¨ Os longos duzentos quilómetros não a deixavam mais triste nem a faziam sentir-se mais isolada do que a consciência de que eles eram eles, e estavam juntos, e ela era apenas ela, longe deles, sozinha. E, sentindo um enjoo, causado por essa sensação, ocorreu-lhe, de repente, um pensamento e uma explicação, e quase disse em voz alta: «Eles são o ‘nós’ de mim!». Na véspera, e em todos os doze anos de sua vida, fora apenas Frankie. Era uma pessoa «eu», que tinha de se virar e fazer as coisas sozinha. Todas as outras pessoas tinham um «nós» a reivindicar, todas, menos ela. Quando Berenice dizia «nós», referia-se a Honey, a sua mãe, ao seu barracão ou à sua igreja. O «nós» do pai dela era a loja. Todos os sócios de clubes têm um «nós» a que pertencem, e a respeito do qual falam. Os soldados no exército podem dizer «nós», e até mesmo os criminosos, acorrentados uns aos outros. Mas a velha Frankie não tinha nenhum «nós» a reivindicar, a menos que fosse o terrível «nós» do seu verão com John Henry e Berenice – e aquele era o último «nós» que desejava.
Carson
McCullers
-
A
Sócia do Casamento
(excerto)
MEMÓRiA
25SET1807-1859 - Alfred Lewis Vail, aliás Alfred Vail: Mecânico e inventor americano, autor do panfleto The American Electro Magnetic - Dots, Lines and Spaces Created on Board the Packet Sully, By Prof. Samuel F.B. Morse (1945); fez parceria com Morse, após a sua demonstração pública do aparelho telegráfico (1837), contribuindo ainda para melhorar os instrumentos, em especial o relé. IMAG.24
25SET1897-1962
-
William Cuthbert Faulkner,
aliás William Faulkner: Escritor americano, Prémio Nobel da
Literatura em 1949 - «Olhando
de perto, um sonho não é algo que esteja isento de perigos. É como
uma pistola com dois gatilhos… Se existe durante muito tempo, acaba
por ferir alguém».
IMAG.86-153-231-232-305-340-356-377-438-578
1894-26SET1937
- Bessie Smith: Cantora
americana de blues
- «It’s
all about a man, who always kicks and dogs me aroun’ / And when I
try to kill him, that’s when my love for him come down.».
IMAG.148
1834-27SET1917
-
Edgar Hilaire Germain Degas,
aliás Edgar Degas: Pintor francês - «Eu gostava de ser famoso, mas
desconhecido».
IMAG.81-148-416-459-488
27SET1627-1704
- Jacques Bossuet: Teólogo francês - «A ambição é, entre todas
as paixões humanas, a mais ferina nas suas aspirações e a mais
desenfreada nas suas cobiças e, todavia, a mais astuta no intento e
a mais ardilosa ao planear». IMAG.462
1905-2SET1957
- Leopoldo Longanesi, aliás Leo Longanesi: Pintor, gráfico,
humorista, escritor, jornalista e editor italiano - «O paradoxo é o
luxo das pessoas de espírito… A verdade é o lugar-comum dos
medíocres». IMAG.528
29SET1547-1616
- Miguel de Cervantes Saavedra: Ficcionista, poeta e dramaturgo
castelhano, autor de Dom
Quixote (1605)
- «A
liberdade é um dos dons mais preciosos que o céu deu aos homens.
Nada a iguala, nem os tesouros que a terra encerra no seu seio, nem
os que o mar guarda nos seus abismos. Pela liberdade, tanto quanto
pela honra, pode e deve aventurar-se a nossa vida».
IMAG.25-38-79-92-103-349-503-559-609-616
¨
16FEV1917-29SET1967
- Lula Carson Smith, aliás Carson McCullers: Escritora americana -
«Muitas vezes, o amado desencadeia a força lentamente acumulada no
coração daquele que ama. O amor é uma coisa solitária. É esta
descoberta que faz sofrer». IMAG.317-392
1923-29SET1997
- Roy Fox Lichtenstein, aliás Roy Lichtenstein: Pintor americano,
ligado à Pop Art e inspirado pela banda desenhada - «Agrada-me
presumir que a minha arte não tem nada a ver comigo».
IMAG.70-440-463
INVENTÁRiO
Miguel
de Cervantes
Miguel
de Cervantes Saavedra foi um génio, e pode-se dizer mesmo o génio
do bom senso. Na sua obra, cujo herói é um dementado, vibram-se
profundos gilvazes a todas as demências humanas: e ela não fere tão
vivamente o espírito de todos só porque é cáustica: mas sim
porque é causticamente, crudelissimamente, sensata. Daí todo o seu
sucesso. Daí toda a perdurabilidade desta obra que não teria um
carácter tão imutável se fosse unicamente alegre, ou se fosse
simplesmente imaginosa. A imaginação é um grande dom, que tem uma
larga influência nos povos infantis; mas o bom senso é uma
faculdade rara, quando aliada à imaginação, que se esculpe
imperecivelmente nos povos lógicos, nos povos racionalistas, nos
povos reflectidos das civilizações adiantadas. Quando, porém, à
imaginação e ao bom senso se acrescenta a irresistível, a
demolidora ironia, essa obra toma um carácter mais imutável do que
o bronze de Corinto, ou a estátua grega de um mestre, feita com
mármore pentélico.
Assim
se explica a acolhida que ela tem ainda hoje, como no tempo de Filipe
III, e que continuará a alcançar dos nossos pósteros, quando já
não restar na memória do homem um hexâmetro grego de Homero, nem
um versículo hebraico do Pentateuco de Moisés. Acrescente-se a isto
que o seu herói tem o carácter profundamente objectivo, na sua
subjectividade, e ter-se-á explicado as causas que fizeram deste
livro um monumento verdadeiramente cosmopolita e humano. Neste
género, com tais requisitos, só uma obra conhecemos que rivalize
com D.
Quixote,
e que talvez para os espíritos delicados e subtis, se avantaja
ainda: é As
Viagens de Gulliver,
de Swift.
Nesta
obra tudo tem um carácter de mais originalidade e de mais subtileza.
Sendo eminentemente humana, isto é, sendo uma sátira dum carácter
verdadeiramente universal, tem talvez como vantagem para nós,
empregar um humour
muito mais ático, – se é possível fazer ático sinónimo de
delicado, – em vez do grosso sal de cozinha de que em largas doses
se serve Cervantes, como condimento. A sua imaginação é decerto
muito mais rica: e em bom senso cáustico não lhe fica também, em
nada, inferior. Falta porém ao seu herói aquele entusiasmo
simpático do D.
Quixote,
que tanto nos prende a ele, mau grado todas as suas demências, e
todas as suas insânias cavaleirosas e andantes. Falta-lhe também
aquele já hoje lendário escudeiro Sancho Pança, cavalgando no seu
lendário sendeiro, através dos montes e dos vales de Espanha, atrás
do seu cavaleiro, que vai em demanda de gigantes e do elmo de
Mambrino: tipo patusco e bon
vivant,
folião e pantagruélico, tão dementado como positivo, tão burlesco
como escudeiro leal, símbolo de burguês de todas as eras, e do
materialismo ventrúdo de todos os tempos. A firmeza de traços com
que estão pintadas, à Velásquez, estas duas figuras típicas, no
meio dos episódios e dos vários acidentes, sem nunca se
desmentirem, nem nunca se desmancharem, é decerto dum relevo cómico,
que os não torna inferiores, antes os sobreleva aos personagens do
teatro de Lope de Vega, ou de Calderón de la Barca.
- Gomes
Leal (excerto)
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