José
de Matos-Cruz | 8 Junho 2018 | Edição Kafre | Ano XV – Semanal –
Fundado em 2004
PRONTUÁRiO
TESTEMUNHOS
O
documentarismo constitui, no cinema português, o seu domínio mais
fecundo e genuíno, explorado em múltiplas tendências ou
correspondências. De facto, num país com pequena e precária
indústria das imagens animadas, tal expressão assumiria uma
alternativa importante, na própria função técnica e continuidade
profissional, investida mesmo como elemento estético, temático e
poético, em fitas de representação ficcional. Nas referências da
actualidade, pelas expectativas em risco, repercutiu-se um olhar
retrospectivo - no qual evoluem as emoções e a maturidade, cruzando
afinal os múltiplos registos que o cinema propiciou. É o estímulo
das fotografias vivas, cujas representação e projecção readquirem
primordiais virtualidades. De certo modo, a nossa própria
experiência de ideais, sucessos e desaires também está assim
estigmatizada ou latente. Sublimando uma abordagem sobre as pessoas,
os eventos e as paisagens, em recorrente transfiguração lírica ou
simbólica, o documentarismo afirmou-se, sobretudo, por uma fusão
aliciante entre realismo e criatividade. Em causa, está a constância
de um olhar sobre a história e a memória, contrastando a evocação
ou o testemunho. Essa navegação imaginária que, portanto, nos faz
presente entre o passado e o futuro. Além disso, o documentarismo
desempenhou, com frequência, uma manifestação de vanguarda, quanto
às fases de viragem na produção ou na criatividade. Pioneiro e
referencial, logo quando a maravilha técnica desponta. Em pujante
expressão artística, pela transição entre o mudo e o sonoro.
Persistindo ao longo de décadas, com o empenho e a obstinação de
vários cinegrafistas, cada um com a sua marca peculiar.
CALENDÁRiO
19JAN-04MAR2017
- Em Lisboa, Galeria Pedro Cera apresenta Late
Night Shopping - exposição
de pintura de Gil Heitor Cortesão.
21JAN-19FEV2017
- Em Sintra, Museu do Ar apresenta Penetrando
Em Outras Dimensões -
exposição de pintura de Rosário Figueiredo Gomes, com fotografias
de Cristina Menezes Alves e Luís Miguel Azevedo.
21JAN-25FEV2017
- No Porto, Espaço Mira apresenta Saturnidade
- exposição de pintura, desenho, escultura e vídeo de Isabel
Ribeiro, sendo curador José Maia. IMAG.543
1940-25JAN2017
- John Vincent Hurt, aliás John Hurt: Actor inglês de
teatro, televisão e cinema, intérprete de O
Homem-Elefante / The Elephant Man
(1980 - David Lynch) - «A sua carreira foi a de um eterno
secundário, com uma invulgar capacidade de transfiguração» (João
Lopes). IMAG.74
24FEV1927-27JAN2017
- Paulette Germaine Riva, aliás Emmanuelle Riva: Actriz francesa de
teatro e cinema, protagonista de Hiroxima,
Meu Amor / Hiroshima Mon Amour
(1959 - Alain Resnais) - «Vi tudo… Tudo!». IMAG.502
05FEV2017
- Bando à Parte produziu, e estreia no Porto, Ornamento
e Crime (2015) de Rodrigo
Areias; com Edgar Pêra e Vítor Correia. IMAG.284-414-514-522
23FEV-09ABR2017
- Em Lisboa, Museu Nacional de Arte Antiga/MNAA apresenta, na Galeria
de Exposições Temporárias, A
Cidade Global - Lisboa No Renascimento,
sendo comissárias Annemarie Jordan Gschwend e Kate Lowe.
15FEV-16ABR2017
- No Centro Cultural de Cascais, Fundação D. Luís I apresenta Uma
Viagem Simbólica: Bairro Histórico de Cascais
- exposição de pintura de MAN. IMAG.360
VISTORiA
Não
sei quem sou, que alma tenho.
Quando
falo com sinceridade, não sei com que sinceridade falo.
Sou
variamente outro do que um eu que não sei se existe (se é esses
outros).
Sinto
crenças que não tenho. Enlevam-me ânsias que repudio.
A
minha perpétua atenção sobre mim perpetuamente me aponta traições
da alma a um carácter que talvez eu não tenha, nem ela julga que eu
tenho.
Sinto-me
múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que
torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não
está em nenhuma e está em todas.
Como
o panteísta se sente árvore e até a flor, eu sinto-me vários
seres. Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente, como se
o meu ser participasse de todos os homens, incompletamente de cada
um, por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço.
Fernando
Pessoa
-
Para a Explicação da Heteronímia
TRAJECTÓRiA
VIEIRA
DA SILVA
Maria
Helena Vieira da Silva nasceu em Lisboa, a 13 de Junho de 1908. Cedo
motivada em música e literatura, não tardou a revelar-se para o
desenho e a pintura. Atraída pela escultura, em 1924 estudou
Anatomia na Escola de Belas Artes de Lisboa. Em Paris aos vinte anos,
frequentou as academias La Grande Chaumière e Scandinave, foi aluna
de Fernand Léger e trabalhou com Dufresne e Waroquier. Em 1930,
casou com o pintor húngaro Arpad Szènes. Em 1931, expôs nos Salons
d’Automne e Surindépendants. Em 1932, tornou-se discípula de
Bissière, na Académie Ransom. Até finais dos anos ’30,
desenvolveu a perspectiva e a repetição, distinguindo-se L’Atelier
(1940 - óleo sobre tela).
Com a II Guerra Mundial, e após passagem por Lisboa, radicou-se com
Arpad no Brasil, expondo no Museu Nacional de Belas-Artes (1942) e
concluindo La Partie d’Échecs
(1943). Em 1947, regressou a
Paris, assinando Bibliothèque
(1949). Distinguindo-se no Abstraccionismo Lírico da Escola de
Paris, apresentou Bataille des
Rouges et des Bleus (1953).
Em 1956, naturalizou-se francesa, com Arpad. Galardoada com o Prémio
Internacional de Pintura na Bienal de São Paulo (1961), executou
L’Enterprise Impossible
(1961-1967). Alvo de uma
Retrospectiva integral na Fundação Calouste Gulbenkian, após a
Revolução dos Cravos o Presidente da República impôs-lhe a
Grã-Cruz de Sant’Iago e Espada. Falecido Arpad em 1985, no ano
seguinte concluiu Soleils.
Em 1988, o Governo atribuiu-lhe a Ordem da Liberdade. Criada a
Fundação Arpad Szènes-Vieira da Silva em 1990, em 1991 recebeu o
grau de Oficial da Légion d’Honneur pela República Francesa.
Faleceu em Paris, a 6 de Março de 1992.
MEMÓRiA
09JUN1918-2011
- Vitorino Barbosa de Magalhães Godinho, aliás Vitorino Magalhães
Godinho: Historiador, professor universitário, autor de Ensaios
e Estudos - Uma Maneira de Pensar (2009)
- «Foi até ao fim um cidadão empenhado, preocupado com o
lançamento das bases de uma sociedade democrática» (Guilherme
d’Oliveira Martins). IMAG.207-244-358
10JUN1918-2015
- Henriette Eugénie Jeanne Ragon,
aliás Patachou: Cantora e actriz francesa - «A [sua] voz rouca
fazia romper a alegria popular, às vezes trocista, às vezes
brejeira, gritando gosto pela vida» (José Cutileiro).
IMAG.568
13JUN1888-1935
- Fernando António Nogueira Pessoa, aliás Fernando Pessoa: Escritor
português, poeta e ficcionista - «Nós nunca nos realizamos. Somos
dois abismos - um poço fitando o céu».
IMAG.26-28-64-82-130-131-157-182-187-196-207-211-236-264-323-326-330-333-343-347-376-382-384-385-395-399-403-404-417-426-433-450-460-467-491-507-509-524-540-551-556-561-576-593-596-604-605-612-613-617-622-632-638-640-645
13JUN1908-1992
- Maria Helena Vieira da Silva: Artista plástica portuguesa,
naturalizada francesa (1956) - «Às vezes, pelo caminho da arte,
experimento súbitas, mas fugazes iluminações e então sinto por
momentos uma confiança total, que está além da razão. Algumas
pessoas entendidas que estudaram essas questões dizem-me que a
mística explica tudo. Então, é preciso dizer que não sou
suficientemente mística. E continuo a acreditar que só a morte me
dará a explicação que não consigo encontrar».
IMAG.14-39-42-75-134-168-182-224-227-382-386-392-434-461-486-490-499-500-502-522-553-554-567-579-603-604-609
13JUN1928-2015
- John Forbes Nash Jr, aliás John Nash: Matemático americano -
«Talvez seja bom ter uma mente brilhante, mas um dom ainda maior é
descobrir um coração bonito». IMAG.571
14JUN1908-1979
-
Joaquim
Belford Correia da Silva, aliás Joaquim
Paço d’Arcos: Ficcionista, poeta e ensaísta português - «Eu não
quis fazer História, pretendi escrever umas páginas poucas em que
focasse a miséria duns e a grandeza de outros.» (Herói
Derradeiro -
Introdução). IMAG.219-230-529
1923-15JUN1968
- John Leslie Montgomery, aliás Wes Montgomery: Guitarrista
americano de jazz,
Prémio New Star (1960) da revista Down
Beat - «desenvolveu um
estilo único de dedilhado com o polegar, bem como um modo de tocar
em oitavas, que se tornariam as suas marcas registadas. A sua extrema
liberdade e fluidez no instrumento chamaram, desde o início, a
atenção» (Fernando Jardim) - «Se um artista de jazz
está efectivamente a tocar, o executante de música clássica tem,
necessariamente, de o respeitar». IMAG.419-505
PARLATÓRiO
Não
é possível analisar os problemas da realidade portuguesa
contemporânea sem os inserir na trama da evolução do nosso país,
quer dizer, sem estudar as condições de formação do mundo em que
vivemos, a génese da nossa cultura, da nossa sociedade, da estrutura
político-económica de Portugal.
Vitorino
Magalhães Godinho
Relógio
D’Água edita Ensaios
Escolhidos de George Orwell
(1903-1950); tradução de José Miguel Silva.
IMAG.170-205-212-222-259-313-318-419-424-476
EXTRAORDINÁRiO
OS
SOBRENATURAIS – Folhetim Aperiódico
MAL
TORNA AO CRIADOR QUEM, SUJEITO, SE REFAZ -
9
Depois,
Joel tornou-se proxeneta de almas, escavando nelas, estilizado, um
suplício irritante, como funcionário catártico do Poder vigente.
Às tantas, canino, deleitava-se mesmo a infligir tormentos vãos aos
pobres diabos, idealistas, num desbarato quanto à integridade
militante.
– Continua
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