José
de Matos-Cruz | 08 Outubro 2016 | Edição Kafre | Ano XII – Semanal – Fundado em
2004
PRONTUÁRiO
Da
crise que, ciclicamente, paira sobre o nosso panorama em quadradinhos,
afectando sobretudo a relação entre profissionais e público leitor, é possível
paralelamente extrair significativas ilações e experiências. Umas e outras de
importância decisiva para os nóveis artistas, reivindicando um justo direito de
divulgação mas, ao mesmo tempo, cientes de que a respectiva obra reflecte
problemáticas próprias, e tem em vista destinatários específicos. Portanto,
exigindo equivalentes meios de difusão - através de empresas que assumam o
risco, registem a diversidade e proponham alternativas. Assim resultaria, sob
chancela das Edições Polvo, pela vertente de Banda Desenhada - ao estilizar um
testemunho criativo sempre propício às cumplicidades radicais, exploratórias,
virtuais. Por exemplo, O Diário de K. (2001) por Filipe Abranches, adaptando A Morte do Palhaço por Raul Brandão. «Sonhar é tudo o que
resta. Sonhar. Um uivo na noite… e folhas dispersas de um diário.» Já em 2011, O Diário de K. foi incluído no livro 1001 Comics You Must Read Before You Die
(1001 Bandas Desenhadas Para Ler Antes de
Morrer), do jornalista e escritor britânico Paul Gravett, assinalando a
única presença portuguesa. IMAG.17-29-129-244-384-416-430-502
CALENDÁRiO
¸1939-30AGO2015
- Wesley Earl Craven, aliás Wes Craven: Cineasta americano, realizador,
argumentista, produtor e actor - «Para mim, o cinema é uma das principais
formas de arte. Um meio incrivelmente poderoso, para contar histórias que façam
as pessoas rir ou gritar, e inspirá-las a tocar as estrelas». IMAG.341
¸03SET2015
- Cinemundo estreia Vontade de Vencer de André Banza; com Anselmo Ralph.
µ04SET-11OUT2015
- Em Lisboa, Fundação EDP apresenta no Museu da Electricidade, em parceria com
Fundação Cupertino de Miranda, Mário Cesariny [de Vasconcellos - 1923-2006] -
Em Casas Como Aquela; exposição de fotografia de Duarte Belo, sendo comissário
António Gonçalves. IMAG.17-19-20-29-66-123-179-430-442-475-486-505-537
¢08OUT2015-20FEV2016
- Em Lisboa, Atelier-Museu Júlio Pomar apresenta Júlio Pomar e Rui Chafes:
Desenhar - exposição de escultura e desenho, sendo curadora Sara Antónia Matos.
IMAG.19-65-299-312-364-427-449-461-495-500-505-534-552-553-562-568
¢17OUT2015-10JAN2016
- No Porto, Museu de Arte Contemporânea de Serralves expõe A Minha Obra É o Meu
Corpo / O Meu Corpo É a Minha Obra - retrospectiva de Helena Almeida, sendo
curadores João Ribas e Marta Moreira de Almeida. IMAG.461-475-486-554
VISTORiA
¨Quem pode impedir a Primavera
Se as árvores se vão cobrir de flores
E o homem se sentiu sorrir à Vida?
Se as árvores se vão cobrir de flores
E o homem se sentiu sorrir à Vida?
Quem pode impedir a surda
guerra
Que vai nos campos deslocando as pedras
– Mudas comparsas no ritmo das estações –
E da terra inerte ergueu milhares de lanças
Que a tremer avançam, cintilantes, para o limite
Em que a luz aquosa se derrama
Como um mar infinito onde o arado
Abre caminho misterioso à seiva inquieta!
Que vai nos campos deslocando as pedras
– Mudas comparsas no ritmo das estações –
E da terra inerte ergueu milhares de lanças
Que a tremer avançam, cintilantes, para o limite
Em que a luz aquosa se derrama
Como um mar infinito onde o arado
Abre caminho misterioso à seiva inquieta!
Quem pode impedir a Primavera
Se estamos em Maio e uma ternura
Nos faz abrir a porta aos viandantes
E o amor se abriga em cada um dos nossos gestos.
Se estamos em Maio e uma ternura
Nos faz abrir a porta aos viandantes
E o amor se abriga em cada um dos nossos gestos.
Quem?…
Se os sonhos maus do Inverno dão lugar à Primavera!
Se os sonhos maus do Inverno dão lugar à Primavera!
Ruy Cinatti
VISTORiA
O Mestre
¨Quando
as trevas começaram a cair sobre a Terra, José de Arimateia acendeu uma tocha
de pinheiro e desceu da colina para o vale. Tinha que fazer em casa. E, ajoelhando-se
sobre as pedras do Vale da Desolação, viu um jovem que estava nu e chorava. Os
seus cabelos eram da cor do mel, e o corpo tão branco como uma flor. Mas ferira
o corpo nos espinhos e, sobre os cabelos, pusera cinza à guisa de coroa.
E
José, que possuía grandes virtudes, disse ao jovem que se encontrava nu e
chorava:
–
Não me admira que o teu sentimento seja tão grande, porque, realmente, Ele foi
um homem justo.
E
o jovem respondeu:
–
Não é por Ele que choro, mas por mim mesmo. Eu também alterei a água em vinho,
curei o leproso e restituí a vista ao cego. Andei sobre as águas e, das
profundezas dos sepulcros, expulsei os demónios. Alimentei os famintos no
deserto, onde não havia comida; ergui os mortos dos leitos exíguos e à minha
ordem, diante de imensa multidão, uma figueira seca novamente frutificou. Tudo
o que esse homem logrou, também eu realizei e, todavia, não me crucificaram.
Oscar Wilde
- Poemas Em Prosa e Salomé
¨…Há
na nossa sociedade outro princípio de exclusão: não já um interdito, mas uma
partilha e uma rejeição. Penso na oposição da razão e da loucura (folie). Desde
os arcanos da Idade Média que o louco é aquele cujo discurso não pode
transmitir-se como o dos outros: ou a sua palavra nada vale e não existe, não
possuindo nem verdade nem importância, não podendo testemunhar em matéria de
justiça, não podendo autentificar um acto ou um contrato, não podendo sequer, no
sacrifício da missa, permitir a transubstanciação e fazer do pão um corpo; ou,
como reverso de tudo isto, e por oposição a outra palavra qualquer, são-lhe
atribuídos estranhos poderes: o de dizer uma verdade oculta, o de anunciar o
futuro, o de ver, com toda a credulidade, aquilo que a sagacidade dos outros
não consegue atingir. É curioso reparar que na Europa, durante séculos, a
palavra do louco, ou não era ouvida, ou então, se o era, era ouvida como uma
palavra verdadeira. Ou caía no nada – rejeitada de imediato logo que proferida;
ou adivinhava-se nela uma razão crédula ou subtil, uma razão mais razoável do
que a razão das pessoas razoáveis. De qualquer modo, excluída ou secretamente
investida pela razão, em sentido estrito, ela não existia. Era por intermédio
das suas palavras que se reconhecia a loucura do louco; essas palavras eram o
lugar onde se exercia a partilha; mas nunca eram retidas ou escutadas. A nunca
um médico ocorrera, antes do final do século XVIII, saber o que era dito (como
era dito, por que é que era dito isso que era dito) nessa palavra que, não
obstante, marcava a diferença. Todo esse imenso discurso do louco recaía no
ruído; e se se lhe dava a palavra era de modo simbólico, no teatro, onde se
apresentava desarmado e reconciliado, já que aí representava a verdade
mascarada.
Michel Foucault
- A Ordem do
Discurso (1971 - excerto)
- Tradução de
Edmundo Cordeiro, António Bento
BREVIÁRiO
¨Porto
Editora lança A Erva das Noites de
Patrick Modiano; tradução de Carlos Sousa de Almeida. IMAG.535-552-553-555-564-571-578
¯Universal
edita em CD, sob chancela Decca, St.
Petersburg por Cecilia Bartoli, com I Barocchisti sob a direcção de Diego
Fasolis. IMAG.69-288-338-445-498-520
¨Relógio
D’Água edita Diários de Viagem de
Franz Kafka (1883-1924); tradução e introdução de Isabel Castro Silva. IMAG.31-84-131-165-426-469-474-493
¨Quetzal
edita A Casa da Aranha de Paul Bowles
(1910-1999); tradução de Jorge Pereirinha Pires. IMAG.204-247-251-304-469
MEMÓRiA
¯1824-11OUT1896
- Anton Bruckner: Compositor austríaco - «A sua Oitava Sinfonia é a criação de
um gigante, ultrapassando em dimensão espiritual e magnitude de concepção todas
as outras sinfonias do Mestre» (Hugo Wolf). IMAG.104-233-323-404-437-440-481-563
¢1848-11OUT1926
- Albert Robida: Ilustrador e litografo francês, autor de livros como O Século Vinte (1883) e A Vida Eléctrica (1890) - imaginou como
seria a vida quotidiana, concebendo invenções sobre o futuro.
®11OUT1936-2010
- Maria Dulce: Actriz portuguesa de cinema, teatro e televisão - «Tenho orgulho
de ser altamente profissional, de nunca me atrasar e de ter os textos todos
trabalhados. Sinto que ainda podia fazer muito na representação, e é com muita
mágoa que vou encarando este momento como o fim da minha carreira. Tenho pena
que seja desta forma tão inglória, porque ainda estou muito funcional e só
queria ter trabalho» (2009). IMAG.117-322
¨
1915-12OUT1986 - Ruy Cinatti: Poeta e antropólogo português - «Teus olhos,
Honorine, cruzaram oceanos, / longamente tristes, sequiosos, / como flor aberta
nas sombras em busca do Sol. / Vieram com o vento e com as ondas, / através dos
campos e bosques da beira-mar. / Vieram até mim, estudante triste, / dum país
do Sul.». IMAG.95-506
¨
15OUT1926-1984 - Michel Foucault: Historiador francês, filósofo e ensaísta -
«Acredito demasiado na verdade para não supor que existam diferentes verdades e
diversas maneiras de dizê-la». IMAG.102-472
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