quarta-feira, dezembro 19, 2018

IMAGINÁRiO #749

José de Matos-Cruz | 01 Abril 2020 | Edição Kafre | Ano XVI – Semanal – Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

INSPIRAÇÕES
Após uma primeira geração de notáveis artistas pioneiros, a banda desenhada de expressão franco-belga explora distintos horizontes e protagonistas, sob a estratégia das principais editoras, e visando um mais amplo público de adolescentes e adultos. Aos aliciantes da aventura correspondem os temas virtuais ou consagrados, estilizando-se versáteis grafismos pela pulsão estética e narrativa. Por tais parâmetros sobressai a dupla Yslaire (aliás Bernard Hislaire, argumentista e ilustrador) & Balac (aliás Yann/Yannick le Pennetier, argumentista parcial), revelada com Sambre (1986).
Tudo começa com Olhos de Sangue, cuja acção decorre numa sociedade rural, pela viragem ao século passado, sob privilégios e humilhações, com uma inspiração romântica traçada entre O Vermelho e o Negro e O Monte dos Vendavais. Em causa, o infante Bernard, arrebatado herdeiro de família, e a jovem Julie, filha de prostituta feiticeira. Assim contam as superstições da terra, corroboradas por um obscuro ensaio antropológico - sinais que se precipitam em conflito tenso mas arrebatador, de vingança latente e sacrifício póstumo… Sambre é uma proposta para leitores maduros, ávidos de emoções fortes, sensuais, sob um erotismo mórbido, cuja ressurreição se precipitaria em Eu Sei Que Tu Virás
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CALENDÁRiO

01SET-06OUT2018 - No Porto, Espaço Mira apresenta My Own Moon - exposição de vídeo (2009), música (com João Taborda) e desenho de António Olaio, sendo curadores José Maia e João Terras. IMAG.677

05SET-13OUT2018 - Em Lisboa, Artistas Unidos expõe, no Teatro da Politécnica, Desenhos de Catarina Lopes Vicente. IMAG.480

05SET-04NOV2018 - Em Vila Nova de Gaia, Arrábida Shopping apresenta Iconic Bowie - exposição de fotografia sobre David Bowie (1947-2016) por Terry O’Neill, Markus Klinko, Norman Parkinson, Justin de Villeneuve, Milton H. Greene e Gerald Fearnley, sendo curadores Cristina Carrillo de Albornoz Fisac e David Fonseca.
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1936-06SET2018 - Burton Leon Reynolds Jr, aliás Burt Reynolds: Actor e cineasta americano, realizador e produtor: «Quando temos a etiqueta de sex symbol, o nosso coeficiente de inteligência baixa aos olhos das outras pessoas». IMAG.249

06SET-21OUT2018 - Em Lisboa, Museu do Design e da Moda/MUDE expõe, no Amoreiras, Presente Futuro. Design Para a Mudança, sendo curadora Bárbara Coutinho.

14SET-28OUT2018 - Em Odivelas, Centro Cultural Malaposta apresenta Reencontros - exposição de pintura de Vítor Moinhos.

VISTORiA

Onde Porei Meus Oihos

Onde porei meus oihos que não veja
A causa, donde nasce meu tormento?
A que parte irei c’o pensamento
Que pera descansar parte me seja?

Já sei como s’engana quem deseja,
Em vão amor firme contentamento,
De que, nos gostos seus, que são de vento,
Sempre falta seu bem, seu mal sobeja.

Mas inda, sobre claro desengano,
Assim me traz est’alma sogigada,
Que dele está pendendo o meu desejo;
E vou de dia em dia, de ano em ano,
Após um não sei quê, após um nada,
Que, quanto mais me chego, menos vejo.
Diogo Bernardes

VISTORiA

Na planície rasa, sob a noite sem estrelas, de uma escuridão e espessura de tinta, um homem caminhava sozinho pela estrada real que vai de Marchiennes a Montsou, dez quilómetros rectos de percurso cortando os campos de beterraba. À sua frente, não enxergava nem mesmo o solo negro e somente sentia o imenso horizonte achatado através do sopro do vento de Março, rajadas largas como sobre um mar, geladas por terem varrido léguas de pântanos e terras nuas. Nem sombra de árvore manchava o céu; a estrada desenrolava-se recta como um quebra-mar em meio à cerração ofuscante das trevas.
O homem partira de Marchiennes lá pelas duas horas. Caminhava a passos largos, tiritando sob o algodão puído de sua jaqueta e da calça de veludo. Um pequeno embrulho, feito com um lenço de quadrados, incomodava-o bastante; ora o mantinha apertado debaixo de um braço, ora de outro, para poder assim enfiar no fundo dos bolsos as mãos entorpecidas que o açoite do vento leste fazia sangrar. Uma única ideia lhe ocupava o cérebro vazio de operário sem trabalho e sem tecto, a esperança de que o frio se tornasse menos agudo com o romper do dia. Havia uma hora que ele caminhava assim, quando percebeu à esquerda, a dois quilómetros de Montsou, uns clarões vermelhos, três braseiros queimando ao ar livre, e como que suspensos. A princípio hesitou, tomado de receio; mas logo após não pôde resistir à necessidade dolorosa de aquecer por um instante as mãos.
Entrou por um atalho que se afundava campo adentro. Tudo desapareceu. À sua direita o homem tinha uma paliçada, um pedaço de tapume feito de pranchas grossas protegendo uma via férrea, enquanto à esquerda se elevava um talude de erva encimado por empenas confusas, visão de uma aldeia de tectos baixos e uniformes. Percorrera uma distância aproximada de duzentos passos quando, bruscamente, numa volta do caminho, os fogos reapareceram próximos dele, sem que o homem chegasse a compreender como podiam elevar-se tão alto no céu morto, iguais a luas enevoadas. Mas, ao nível do solo, outro espectáculo o fazia parar. Era uma massa pesada, um amontoado de construções de onde se levantava a silhueta da chaminé de uma fábrica.
Émile Zola
- Germinal (1885, excerto)

MEMÓRiA

02ABR1840-1902 - Émile-Édouard-Charles-Antoine Zola, aliás Émile Zola: Escritor francês - «Considerado individualmente, o espectador é, por vezes, um homem inteligente; mas os espectadores, considerados em massa, são um rebanho que o génio ou até o simples talento tendem a conduzir de chicote em punho». IMAG.269-593-641

07ABR1920-2012 - Robindro Shaunkor Chowdhury, aliás Ravi Shankar: Compositor e executante indiano, inspirou a música pop ao colaborar com The Beatles (anos ’60) - «Na nossa cultura, temos um grande respeito pelos instrumentos musicais, que são como parte de Deus».
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TRAJECTÓRiA

Émile Zola
Principal expoente dos escritores naturalistas, defensor de Dreyfus, Émile Zola deixou para a posteridade uma obra gigantesca, A saga dos Rougon-Macquart, ou História natural e social de uma família no segundo Império. Parisiense, órfão quando muito jovem de seu pai de origem italiana, Zola cresceu na cidade de Aix-en-Provence, tendo sido muito próximo de Cézanne. Em 1858 integra o liceu Saint-Louis em Paris, mas posto que não obtém êxito no exame de bacharelato, opta por um emprego na editora Hachette, da qual se torna diretor de publicidade de 1862 a 1866, o que lhe abrirá as portas do mundo literário.
O projeto Rougon-Macquart teve início em 1868, quando estava mergulhado em plena leitura da obra de Taine e da Comédia Humana de Balzac. Já havia escrito diversos romances, entre eles La Confession de Claude (1865), Le Vœu d'une Morte (1866), Thérèse Raquin (1867) e Madeleine Férat (1868), e buscava naquele momento construir uma obra original, que não se espelhasse em  Goncourt ou Flaubert. Zola tem então a ideia de pintar o retrato de «uma só família, mostrando como um grupo de pessoas evolui dentro de um determinado sistema social». Esse formidável projeto resultará na divisão da árvore genealógica desta família em dois ramos: a legítima e a adúltera, a oficial e a marginal. L’Assommoir / A Taberna, escrito em 1877, faz dele o mais famoso escritor de sua época.
O caso Dreyfus preenche os últimos anos da vida de Zola. Condenado a um ano de prisão depois da publicação em 1898 de seu artigo J'accuse no jornal L'Aurore, Zola decide exilar-se na Inglaterra até ao segundo processo Dreyfus (1899). De volta a Paris, morre asfixiado. Não se descartou a possibilidade de um crime estar por trás de seu falecimento, mas nada foi provado.

ANUÁRiO

1530-1605 - Diogo Bernardes: Poeta português - «Só pera mim nem flor nem erva verde, / Nem água clara tem, nem doce canto, / Que tudo falta a quem falta ventura.». IMAG.60

BREVIÁRiO

Universal edita em CD, sob chancela Deutsche Grammophon, The Paul Badura-Skoda Edition pelo pianista Paul Badura-Skoda.

Assírio & Alvim edita Existência de Gastão Cruz.  
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Universal edita em CD, sob chancela Decca, Johannes Brahms [1833-1897]: Peças Para Piano por Nelson Freire.  
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EXTRAORDINÁRiO

OS SOBRENATURAIS - Folhetim Aperiódico

A MELANCOLIA FIXA DO CONTROLADOR DE ONDAS - 11

Fiel aos desígnios íntimos, fora traído pelos caprichos do Império. E ele, que presenciara o passado a soçobrar, pressentia antecipar-se uma ruína.
Que instigaria, pois, aquela gente variegada?
- Continua

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