José
de Matos-Cruz | 01 Abril 2020 | Edição Kafre | Ano XVI – Semanal –
Fundado em 2004
PRONTUÁRiO
INSPIRAÇÕES
Após
uma primeira geração de notáveis artistas pioneiros, a banda
desenhada de expressão franco-belga explora distintos horizontes e
protagonistas, sob a estratégia das principais editoras, e visando
um mais amplo público de adolescentes e adultos. Aos aliciantes da
aventura correspondem os temas virtuais ou consagrados,
estilizando-se versáteis grafismos pela pulsão estética e
narrativa. Por tais parâmetros sobressai a dupla Yslaire
(aliás Bernard Hislaire, argumentista e ilustrador) & Balac
(aliás Yann/Yannick le Pennetier, argumentista parcial), revelada
com Sambre
(1986).
Tudo começa com Olhos
de Sangue,
cuja
acção decorre numa sociedade rural, pela viragem ao século
passado, sob privilégios e humilhações, com uma inspiração
romântica traçada entre O
Vermelho e o Negro
e O
Monte dos Vendavais.
Em causa, o infante Bernard, arrebatado herdeiro de família, e a
jovem Julie, filha de prostituta feiticeira. Assim contam as
superstições da terra, corroboradas por um obscuro ensaio
antropológico - sinais que se precipitam em conflito tenso mas
arrebatador, de vingança latente e sacrifício póstumo… Sambre
é
uma proposta para leitores maduros,
ávidos de emoções fortes, sensuais, sob um erotismo mórbido, cuja
ressurreição se precipitaria em Eu
Sei Que Tu Virás…
IMAG.553
CALENDÁRiO
01SET-06OUT2018
- No Porto, Espaço Mira apresenta My
Own Moon - exposição de
vídeo (2009), música (com João Taborda) e desenho de António
Olaio, sendo curadores José Maia e João Terras. IMAG.677
05SET-13OUT2018
- Em Lisboa, Artistas Unidos expõe, no Teatro da Politécnica,
Desenhos
de Catarina Lopes Vicente. IMAG.480
05SET-04NOV2018
- Em Vila Nova de Gaia, Arrábida Shopping apresenta Iconic
Bowie - exposição de
fotografia sobre David Bowie (1947-2016) por Terry O’Neill, Markus
Klinko, Norman Parkinson, Justin de Villeneuve, Milton H. Greene e
Gerald Fearnley, sendo curadores Cristina Carrillo de Albornoz Fisac
e David Fonseca.
IMAG.194-223-232-292-333-338-488-600-609-610-621-683
1936-06SET2018
- Burton Leon Reynolds Jr, aliás Burt Reynolds: Actor e cineasta
americano, realizador e produtor: «Quando temos a etiqueta de sex
symbol, o nosso coeficiente
de inteligência baixa aos olhos das outras pessoas». IMAG.249
06SET-21OUT2018
- Em Lisboa, Museu do Design e da Moda/MUDE expõe, no Amoreiras,
Presente Futuro. Design Para a
Mudança, sendo curadora
Bárbara Coutinho.
14SET-28OUT2018
- Em Odivelas, Centro Cultural Malaposta apresenta Reencontros
- exposição de pintura de Vítor Moinhos.
VISTORiA
Onde
porei meus oihos que não veja
A causa, donde nasce meu tormento?
A que parte irei c’o pensamento
Que pera descansar parte me seja?
A causa, donde nasce meu tormento?
A que parte irei c’o pensamento
Que pera descansar parte me seja?
Já
sei como s’engana quem deseja,
Em vão amor firme contentamento,
De que, nos gostos seus, que são de vento,
Sempre falta seu bem, seu mal sobeja.
Em vão amor firme contentamento,
De que, nos gostos seus, que são de vento,
Sempre falta seu bem, seu mal sobeja.
Mas
inda, sobre claro desengano,
Assim me traz est’alma sogigada,
Que dele está pendendo o meu desejo;
Assim me traz est’alma sogigada,
Que dele está pendendo o meu desejo;
E
vou de dia em dia, de ano em ano,
Após
um não sei quê, após um nada,
Que,
quanto mais me chego, menos vejo.
Diogo
Bernardes
VISTORiA
Na
planície rasa, sob a noite sem estrelas, de uma escuridão e
espessura de tinta, um homem caminhava sozinho pela estrada real que
vai de Marchiennes a Montsou, dez quilómetros rectos de percurso
cortando os campos de beterraba. À sua frente, não enxergava nem
mesmo o solo negro e somente sentia o imenso horizonte achatado
através do sopro do vento de Março, rajadas largas como sobre um
mar, geladas por terem varrido léguas de pântanos e terras nuas.
Nem sombra de árvore manchava o céu; a estrada desenrolava-se recta
como um quebra-mar em meio à cerração ofuscante das trevas.
O
homem partira de Marchiennes lá pelas duas horas. Caminhava a passos
largos, tiritando sob o algodão puído de sua jaqueta e da calça de
veludo. Um pequeno embrulho, feito com um lenço de quadrados,
incomodava-o bastante; ora o mantinha apertado debaixo de um braço,
ora de outro, para poder assim enfiar no fundo dos bolsos as mãos
entorpecidas que o açoite do vento leste fazia sangrar. Uma única
ideia lhe ocupava o cérebro vazio de operário sem trabalho e sem
tecto, a esperança de que o frio se tornasse menos agudo com o
romper do dia. Havia uma hora que ele caminhava assim, quando
percebeu à esquerda, a dois quilómetros de Montsou, uns clarões
vermelhos, três braseiros queimando ao ar livre, e como que
suspensos. A princípio hesitou, tomado de receio; mas logo após não
pôde resistir à necessidade dolorosa de aquecer por um instante as
mãos.
Entrou
por um atalho que se afundava campo adentro. Tudo desapareceu. À sua
direita o homem tinha uma paliçada, um pedaço de tapume feito de
pranchas grossas protegendo uma via férrea, enquanto à esquerda se
elevava um talude de erva encimado por empenas confusas, visão de
uma aldeia de tectos baixos e uniformes. Percorrera uma distância
aproximada de duzentos passos quando, bruscamente, numa volta do
caminho, os fogos reapareceram próximos dele, sem que o homem
chegasse a compreender como podiam elevar-se tão alto no céu morto,
iguais a luas enevoadas. Mas, ao nível do solo, outro espectáculo o
fazia parar. Era uma massa pesada, um amontoado de construções de
onde se levantava a silhueta da chaminé de uma fábrica.
Émile
Zola
-
Germinal
(1885, excerto)
MEMÓRiA
02ABR1840-1902
- Émile-Édouard-Charles-Antoine Zola, aliás Émile Zola: Escritor
francês - «Considerado individualmente, o espectador é, por vezes,
um homem inteligente; mas os espectadores, considerados em massa, são
um rebanho que o génio ou até o simples talento tendem a conduzir
de chicote em punho». IMAG.269-593-641
07ABR1920-2012
- Robindro Shaunkor Chowdhury, aliás Ravi Shankar: Compositor e
executante indiano, inspirou a música pop
ao colaborar com The Beatles (anos ’60) - «Na nossa cultura, temos
um grande respeito pelos instrumentos musicais, que são como parte
de Deus».
IMAG.443
TRAJECTÓRiA
Émile
Zola
Principal
expoente dos escritores naturalistas, defensor de Dreyfus, Émile Zola deixou para a posteridade uma obra gigantesca, A
saga dos Rougon-Macquart, ou História natural e social de uma
família no segundo Império.
Parisiense, órfão quando muito jovem de seu pai de origem italiana,
Zola cresceu na cidade de Aix-en-Provence, tendo sido muito próximo
de Cézanne. Em 1858 integra o liceu Saint-Louis em Paris, mas posto
que não obtém êxito no exame de bacharelato, opta por um emprego
na editora Hachette, da qual se torna diretor de publicidade de 1862
a 1866, o que lhe abrirá as portas do mundo literário.
O
projeto Rougon-Macquart
teve início em 1868, quando estava mergulhado em plena leitura da
obra de Taine e da Comédia
Humana de Balzac. Já havia
escrito diversos romances, entre eles La
Confession de Claude (1865),
Le Vœu d'une Morte
(1866), Thérèse Raquin
(1867) e Madeleine Férat
(1868), e buscava naquele
momento construir uma obra original, que não se espelhasse em
Goncourt ou Flaubert. Zola tem então a ideia de pintar o retrato de
«uma só família, mostrando como um grupo de pessoas evolui dentro
de um determinado sistema social». Esse formidável projeto
resultará na divisão da árvore genealógica desta família em dois
ramos: a legítima e a adúltera, a oficial e a marginal. L’Assommoir
/ A Taberna, escrito em 1877,
faz dele o mais famoso escritor de sua época.
O
caso Dreyfus preenche os últimos anos da vida de Zola. Condenado a
um ano de prisão depois da publicação em 1898 de seu artigo
J'accuse
no jornal L'Aurore,
Zola decide exilar-se na Inglaterra até ao segundo processo Dreyfus
(1899). De volta a Paris, morre asfixiado. Não se descartou a
possibilidade de um crime estar por trás de seu falecimento, mas
nada foi provado.
ANUÁRiO
1530-1605
- Diogo Bernardes: Poeta português - «Só pera mim nem flor nem
erva verde, / Nem água clara tem, nem doce canto, / Que tudo falta a
quem falta ventura.». IMAG.60
BREVIÁRiO
Universal
edita em CD, sob chancela Deutsche Grammophon, The
Paul Badura-Skoda Edition pelo
pianista Paul Badura-Skoda.
Assírio
& Alvim edita Existência
de Gastão Cruz.
IMAG.190-332-408-490-603-627-670-691
Universal
edita em CD, sob chancela Decca, Johannes Brahms
[1833-1897]: Peças Para Piano
por Nelson Freire.
IMAG.82-171-193-199-256-286-303-324-393-417-482-531-554-597-605-608-664
EXTRAORDINÁRiO
OS
SOBRENATURAIS - Folhetim Aperiódico
A
MELANCOLIA FIXA DO CONTROLADOR DE ONDAS -
11
Fiel
aos desígnios íntimos, fora traído pelos caprichos do Império. E
ele, que presenciara o passado a soçobrar, pressentia antecipar-se
uma ruína.
Que
instigaria, pois, aquela gente variegada?
-
Continua
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