José de Matos-Cruz | 24 Junho 2016 | Edição Kafre | Ano XII –
Semanal – Fundado em 2004
PRONTUÁRiO
TRANSFIGURAÇÕES
Em 1917, a I Guerra Mundial devastava a Europa. A 13 de Maio, num
dos ermos vales da Serra de Ourém, três crianças guardavam o rebanho na Cova da
Iria, perto de Fátima. Então, a Virgem Maria apareceu junto às azinheiras
solitárias, numa nuvem luminosa, aos pastorinhos - Lúcia, Jacinta e Francisco.
Falou-lhes de profecia em palavras de fé, tendo recomendado penitência e
oração, para salvação dos males do Mundo. Prometeu ainda voltar todos os dias
13, durante seis meses. Quando as autoridades locais tiveram conhecimento desta
visão, ameaçaram os meninos com castigos, caso eles não se retractassem. Mas os
jovens crentes reafirmaram os factos, inspirando toda a população. No predito 13
de Junho, setenta mil pessoas aglomeraram-se, esperando o fenómeno anunciado.
De súbito, o Sol rompeu, estrelando o céu, sobre a Terra… Eis a ilustração de Fátima (1979) por Eduardo Teixeira Coelho (1919-2005). Uma visão ingénua, fascinante,
sobre as peripécias primordiais - aliando o mistério sobrenatural e a pureza da
mensagem, à transcendência divina. Um grafismo sóbrio, quase tosco na expressão
rústica, a preto e branco, mas de irradiante simbolismo. IMAG.28-31-41-43-85-117-129-132-209-328-372
CALENDÁRiO
¯1918-30ABR2015 - Henriette Eugénie Jeanne Ragon, aliás Patachou:
Cantora e actriz francesa - «A sua voz poderosa, elegante, perfeitamente trabalhada, permitia-lhe a evocação
melancólica dos amores mortos e das separações» (Causeur.fr).
¯16SET1925-14MAI2015 - Riley Ben King, aliás B.B. King:
Cantor americano, compositor e guitarrista - «Tem o mesmo lugar nos blues
que Louis Armstrong tinha no jazz. É
um embaixador para a música» (Peter Guralnick).
14MAI-05JUL2015 - Cidadela de Cascais, nova sede
do evento principal, apresenta World Press Cartoon; sendo curador António Antunes, inclui uma exposição Top 50 dos prémios de
2014, menções honrosas e outros desenhos de humor da melhor produção
internacional. IMAG.35-195-247-353-407-558
¢18MAI2015 - Em Cascais, Fundação D.
Luís I expõe, na Casa Duarte Pinto Coelho, Vulcões
Napolitanos da Colecção
Duarte Pinto Coelho (1923-2010).
¢20MAI-29SET2015 - Em Lisboa, Museu Colecção Berardo expõe O Olhar do Coleccionador por Joe Berardo. IMAG.87-173-195-212-227-246-270-279-294-301-319-337-516-556-558-566
29MAI-14JUN2015 - Em Beja,
decorre o XI Festival Internacional de Banda Desenhada, sendo director Paulo
Monteiro. IMAG.36-250-305-416-514
¢11-27JUN2015 - Em Lisboa,
Zaratan Arte Contemporânea apresenta And
Murders and All - exposição de pintura de Sara Franco. IMAG.168-248-416-430-549
VISTORiA
®Diabo: E as peitas dos judeus
que a vossa mulher levava?
Corregedor: Isso eu não o tomava
eram lá percalços seus.
Nom som pecatus meus,
peccavit uxore mea.
Diabo: Et vobis quoque cum ea,
não temuistis Deus.
A largo modo adquiristis
sanguinis laboratorum
ignorantis peccatorum.
Ut quid eos non audistis?
Corregedor: Vós, arrais, nonne legistis
que o dar quebra os pinedos?
Os direitos estão quedos,
sed aliquid tradidistis...
que a vossa mulher levava?
Corregedor: Isso eu não o tomava
eram lá percalços seus.
Nom som pecatus meus,
peccavit uxore mea.
Diabo: Et vobis quoque cum ea,
não temuistis Deus.
A largo modo adquiristis
sanguinis laboratorum
ignorantis peccatorum.
Ut quid eos non audistis?
Corregedor: Vós, arrais, nonne legistis
que o dar quebra os pinedos?
Os direitos estão quedos,
sed aliquid tradidistis...
Gil Vicente
- Auto da Barca do Inferno
(1517 - excerto)
PARLATÓRiO
A banda
desenhada sempre existiu, com outros nomes ou manifestações, desde um passado
bastante remoto. Os novos processos mediáticos permitem uma difusão maior. A
base da sua actual expressão está, primordialmente, no alemão Albert Dürer
(1471-1528) - que, em gravura, ilustrou duas peças do teatro romano. Entre
muitas coisas, esse foi o labor essencial. Realmente, com características
semelhantes ao que conhecemos hoje, a bd começa no século passado. Mas os
actuais atalhos técnicos atingem extraordinários resultados. Os muitos autores
que se dedicam à bd também contribuíram para sucessivas melhorias.
É preciso
ser meio louco, para dedicar uma vida a fazer banda desenhada. Dá imenso trabalho,
cada obra é infernal em pesquisa, para ter veracidade. O autor de bd deve estar
preparado para ilustrar tudo o que se relaciona com o tema em foco - e isso é
completamente diverso de um pintor subjectivo, ou que se especializa em
retratos, em paisagens, só necessitando depois do seu talento. Nós temos que
desenhar animais, pessoas vestidas ou despidas, em todas as posições, ambientar
outras épocas… Em suma, precisamos de uma grande bagagem. Uns são melhores, outros piores, mas o esforço é igual para
todos.
Em banda
desenhada, cuidar do lado estético e plástico é muito difícil, e ainda pior
analisá-lo. Eu não tenho nenhuma mania
artística, não me sinto incomodado por tais preocupações. Cabe-me,
simplesmente, executar um determinado tipo de trabalho, e é isso que eu tento
fazer, o melhor que posso e sei. Esta foi sempre a minha postura, desde que
comecei a dedicar-me à banda desenhada e à ilustração. Fornecendo, a quem lê ou
olha o que eu faço, um produto agradável, que cumpra o maior número possível de
requisitos e exigências.
Eduardo
Teixeira Coelho
(1998)
BREVIÁRiO
¨Dom Quixote edita Cláudio e
Constantino de Luísa Costa Gomes. IMAG.58-135-298
¨Asa edita O Franco-Atirador
Paciente de Arturo Pérez-Reverte; tradução de Cristina Rodríguez e Artur
Guerra.
¨Relógio D’Água edita O
Planeta do Sr. Sammler de Saul Bellow (1915-2005); tradução de José Miguel
Silva. IMAG.36-87-360-421-518-546-553-555
GALERiA
Vulcões Napolitanos
¢Parte da Colecção de Duarte Pinto Coelho que se encontra em
Cascais ao abrigo de um Protocolo assinado entre a Câmara Municipal de Cascais,
a Fundação D. Luís I e a Fundación Duques de Soria, esta exposição é um raro
momento de confluência da pintura com a sedução de lugares cuja história está
ligada à actividade vulcânica na região de Nápoles, assolada pelas erupções
intermitentes do Vesúvio. Estamos, assim, perante obras que fixaram para a
posteridade, de forma exuberante, antes do advento da fotografia, momentos de
angústia mas também de assinalável expressão plástica.
O Olhar do Coleccionador
¢Uma selecção de obras da Colecção Berardo, feita pelo seu
colecionador, algumas nunca anteriormente exibidas mas que, no conjunto, nos
dão uma visão particular deste monumental acervo. Nas palavras do Comendador
Joe Berardo, também curador, «a presente exposição teve como ponto de partida
algumas obras da colecção que, embora menos conhecidas do público, constituem
parte das minhas predilecções. Trata-se, por isso, de uma selecção de afectos.
Confesso que sempre me senti atraído pela escala opulenta de alguma pintura
moderna, e a selecção de algumas das obras reflecte esse meu fascínio. É, pois,
para essa experiência da desmesura da imaginação e do reconhecimento da própria
vida que esta exposição convida o visitante». Entre muitos outros nomes,
incluem-se obras de Marc Chagall, Pierre Klossowski, Frank Stella, Georg
Baselitz, Sarah Morris e Rui Chafes.
ANTIQUÁRiO
®1465-1536 - Gil Vicente: Dramaturgo, poeta e
ficcionista português - «Juro-vos que de saudade / tanto de pão não comia / a
triste de mi cada dia / doente, era üa piedade. / Já carne nunca a comi, / esta
camisa que trago / em vossa dita a vesti / porque vinha bom mandado.» (Ama - Auto da Índia - 1509, excerto). IMAG.29-63-457-537
¯1926-2013 - Maria Antónia Luna Andermatt, aliás Luna Andermatt:
Bailarina e coreógrafa portuguesa, co-fundadora da Companhia Nacional de
Bailado (1977) - «O trabalho no palco tem que ter fogo. Se não tem fogo, não
presta. É preciso viver por dentro do trabalho. Se não se vive, não presta. O
público percebe muito bem quando não é sentido… Tenho a impressão de que
a dança já nasceu comigo» (2011). IMAG.489
EXTRAORDINÁRiO
OS HUMANIMAIS - Folhetim
Aperiódico
JORNAL D’ONTEM, PAPÉIS VELHOS - 7
- Reparou
nisto? O desplante da criatura… - comentava todavia Silvino de seguida, e em
recato, para o Coronel Mathias Plínio, um oficial de confiança mesmo ao lado.
Não era tanto a insolência que o avespinhara, mas a esperteza do Hortênsio, a
enobrecer a ignorância de saloio.
– Continua
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